Roma (Agência Fides)- A detenção do mais famoso e “mediático” traficante de armas do mundo é um marco para a África? Viktor Bout, ícone do tráfico de armas, foi detido na Tailândia com uma operação digna do filme “O Golpe de mestre”: agentes antidroga norte-americanos, que fingem ser compradores da guerrilha colombiana (as FARC), o levam para uma emboscada, preparada com a ajuda das autoridades de Bangoc.
Já as modalidades da sua prisão são um paradigma daquilo que Bout representa: um traficante global, capaz de agir em todas as partes do mundo, um agente de comércio a serviço dos potentes da vez. Para atrair Bout para a emboscada, recorreu-se à ajuda da Interpol e das autoridades policiais de diversos países, organizando encontros na América Latina, na Europa e na Ásia.
A modalidade da detenção, com a acusação de tentar vender armas à guerrilha colombiana (definida como um grupo terrorista de Washington), poderia parecer curiosa, justamente no momento em que se criou uma forte situação de tensão na América Latina por causa das FARC. Mas a operação que conduziu a sua captura teve início há muito tempo e a sua detenção neste momento parece ditada por uma situação interna da investigação e não condicionada por outros fatores.
Bout foi preso por um crime cometido na América Latina, mas sua área de atuação mais importante foi a África, onde iniciou a sua “carreira”. Praticamente não houve guerra africana nos últimos 15 anos que não tenha sido combatida com armas transportadas pela frota aérea de Bout. Com efeito, Bout não era um traficante, mas o administrador de uma imponente frota de aviões de carga, especializada na entrega, aos locais mais perdidos do mundo, de cargas de armas, muitas das quais provenientes dos imensos depósitos dos países ex-comunistas da Europa Oriental. Por esse motivo, Bout é procurado pela Corte Penal Internacional por cumplicidade nos crimes de guerra no conflito civil em Serra Leoa e na Libéria. Os seus aviões forneceram armas também aos combatentes em Angola, Sudão e República Democrática do Congo. Um “empresário” bem sucedido que, segundo seu biógrafo, Douglas Farah, armava contemporaneamente os dois opositores de uma mesma guerra. Foi o que aconteceu na África, como também no Afeganistão, onde teria armado os talebãs e seus inimigos das forças da Aliança do norte.
Bout, portanto, foi uma figura central nas guerras africanas dos anos 90 e dos primeiros anos do século 21. Guerras onde os protagonistas locais, em grande parte sujeitos extra-estatais (guerrilheiros, milícias, etc...), combatiam para o controle dos recursos de um território, da madeira aos diamantes. Recursos que eram depredados com a cumplicidade de redes criminais transnacionais dotadas de capacidades logísticas e financeiras de primeira categoria. Neste contexto, Bout era o armador que agia em cumplicidade com outros protagonistas internacionais na depredação da África. A sua detenção, portanto, tem um forte significado simbólico para a África, mas não basta. O seu lugar será tomado por outros se não for detida a lógica predatória de quem explora as riquezas africanas.
Por fim, não se deve esquecer que se Bout, durante anos, pôde agir tranquilamente é graças a proteções potentes inclusive de uma parte daquelas administrações que, por anos, estiveram atrás dele. “Meu irmão era um taxista”, disse o irmão de Bout depois de sua detenção: um taxista que desempenhou operações “sujas” também a mando de Estados que, assim, podiam negar “plausivelmente” seu envolvimento. Quantos segredos será então capaz de revelar? (L.M.) (Agência Fides 8/3/2008)